Cientistas alertam que a mudança climática está tornando os insetos mais destrutivos e imprevisíveis

11/08/2019

Em 27 de julho, imagens de uma “invasão” de insetos em Las Vegas percorreram o mundo. Eles foram atraídos principalmente pelas luzes ofuscantes da cidade e, apesar do susto, causaram mais incômodo do que estragos.

Ao mesmo tempo, uma nuvem de insetos no Iêmen, um país devastado pela fome e pela guerra civil, chamou muito menos atenção, mas foi mais preocupante. Eles eram gafanhotos, cujo apetite pode causar danos consideráveis ​​às plantações em mais de 60 países – principalmente na África, no Oriente Médio e na Ásia Central.

Esses eventos podem se tornar uma ocorrência mais frequente – os especialistas temem que a mudança climática faça os insetos agirem de maneira mais destrutiva e imprevisível. Já existem evidências de que o aumento da temperatura terá um efeito direto sobre o metabolismo dos insetos. Um estudo de 2018 publicado por cientistas americanos na revista Science mostrou que o clima mais quente os torna mais ativos e mais propensos a se reproduzir.

Isso também torna as criaturas geralmente mais famintas. Um gafanhoto adulto do deserto é capaz de comer o equivalente a seu próprio peso corporal em um dia. Os pesquisadores estimaram que os danos globais causados ​​por pragas de insetos a trigo, arroz e milho podem aumentar de 10% a 25% por grau Celsius de aquecimento.

O impacto desse dano pode ocorrer em regiões de clima temperado, onde a maioria dos grãos é produzida.

“Com exceção dos trópicos, temperaturas mais altas aumentam as taxas reprodutivas de insetos. Você tem mais insetos e eles comem mais”, escreveu Curtis Deutsch, um dos autores do estudo de 2018.

Embora os gafanhotos não sejam a única espécie a devorar culturas, eles são os mais monitorados por autoridades nacionais e internacionais, graças ao seu potencial destrutivo.

Os esforços nas últimas quatro décadas os mantiveram afastados, mas tem havido surtos graves, como a infestação africana em 2004, que causou danos estimados de US$ 2,5 bilhões para as lavouras.

mbora seja estimado que a proporção global de todos os danos causados ​​por gafanhotos em cultivos seja relativamente pequena em relação a outros insetos – os acadêmicos a estimam em apenas 0,2% – o efeito do enxame em uma determinada localidade pode ser devastador.

“Condições mais secas no futuro nos limites norte e sul da área de distribuição de gafanhotos do deserto podem produzir habitats mais favoráveis ​​para esta espécie e podem ter impactos negativos importantes”, diz o entomologista Michel Lecoq, um dos maiores especialistas em gafanhotos do mundo.

“Os riscos em termos de danos às culturas, pastagens e, em última instância, à segurança alimentar e social de muitas pessoas pobres nos países em desenvolvimento podem ser enormes”, adverte Le Coq.

Pragas do tipo mais devastador, os gafanhotos do deserto, têm o potencial de prejudicar a subsistência de 10% da população mundial, segundo a FAO – Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura.

Um enxame “pequeno” come a mesma quantidade de comida em um dia que cerca de 35 mil pessoas. Seus “petiscos” favoritos incluem grãos básicos como arroz, milho e trigo.

Essas criaturas são alguns dos inimigos mais antigos da humanidade – eles até apareceram na Bíblia e no Alcorão. No mundo antigo, o historiador romano Plínio, o Velho, escreveu que 800 mil pessoas haviam morrido na região que atualmente engloba Líbia, Argélia e Tunísia devido à fome causada por uma praga de gafanhotos.

Mais recentemente, em 1958, na Etiópia, um enxame de gafanhotos que cobriu mais de mil quilômetros quadrados destruiu 167 mil toneladas de grãos – o suficiente para alimentar um milhão de pessoas por um ano.

As regiões temperadas serão mais afetadas pelos insetos com mais fome porque seu metabolismo diminui se ficar muito quente, o que já é o caso em áreas tropicais.

Em 2016, especialistas suspeitam que tenha havido influência do aquecimento global quando a Argentina enfrentou sua maior infestação de gafanhotos em 60 anos. Acredita-se que um inverno mais quente e mais úmido desencadeou o fenômeno.

BBC