A cidade tem solução!

28/07/2015

A cidade tem solução?

O mundo está se tornando predominantemente urbano. Segundo o censo de 2010, mais de 84% da população brasileira vive nas cidades. Aqui moramos, trabalhamos, criamos nossos filhos e nos divertimos, mas também convivemos com os diversos problemas urbanos, tais como a falta de segurança, moradia, a deficiência do transporte, ocupação de áreas de risco, dentre tantos. Fica a questão: a cidade tem solução?

As manifestações recentes, tão importantes para o amadurecimento da nossa democracia, questionam o modelo de desenvolvimento das nossas cidades, clamando por melhorias urgentes na qualidade de vida e incremento da participação popular na gestão urbana.

A sustentabilidade aplicada às nossas cidades é mais abrangente que um conjunto de edificações eficientes e com selos verdes. Isto não significa que o investimento na eficiência energética, no reuso da água, na iluminação e ventilação não seja importante. Mas uma cidade realmente comprometida com as gerações futuras deve incorporar parâmetros diferenciados no planejamento e desenvolvimento urbano, ambiental e metropolitano. Estudos estabelecem uma correlação positiva entre o planejamento urbano e o desenvolvimento.

A cidade promove a troca de conhecimento, mercadorias e serviços, gerando divisas materiais e imateriais. Desenvolver estratégias amplas e inclusivas que incorporem os aspectos cultural, social, ambiental e econômico, dentre outros, tem sido o desafio das cidades contemporâneas.

Isso significa repensar o modelo de desenvolvimentos das cidades, que constantemente concentra as funções institucionais e econômicas de maior relevância em seu núcleo central, relegando para as regiões periféricas as ocupações residenciais de menor poder aquisitivo, distanciando o morador menos favorecido das oportunidades de trabalho, lazer e serviços.

A cidade é o local da festa, como diria Lefebvre. O urbano é a simultaneidade, a reunião, é uma forma social que se afirma!

O programa das Nações Unidas UN-HABITAT, publicou recentemente alguns princípios para o novo modelo urbano do século 21. Dentre eles, destacamos a importância do espaço urbano e de convívio, inserindo o espaço público como espinha dorsal da cidade. Também a necessidade de uma abordagem integrada, eliminando a segregação espacial e reduzindo as desigualdades sociais. O planejamento inteligente, implantando políticas e instrumentos de desenvolvimento sustentável, valorizando a identidade, a cultura e aproveitando as oportunidades locais no contexto global. E a construção coletiva, através de instrumentos efetivos de promoção da gestão democrática e participativa.

O Estatuto da Cidade estabeleceu uma politica de planejamento e desenvolvimento urbano, tendo como objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes. Dentre os avanços destes instrumentos, destacam-se a gestão democrática por meio da participação da população e de associações comunitárias, e a garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte e aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer, para as presentes e futuras gerações.

Repensar e transformar a cidade envolve, necessariamente, uma transformação cultural e econômica. Onde esta a qualidade de vida, as amizades e estórias do bairro, o contato com a natureza, a vida em comunidade?

Explorando o entorno descobriremos este potencial de transformação e requalificação. O Rio de Janeiro redescobriu o bondinho, que circula pelas ruas de Santa Tereza, resgatando a música e a cultura local. A cidade de Nova York transformou um antigo trecho ferroviário urbano em um parque linear, com atrações culturais, turísticas, moda e arte (projeto highline). Medellín, na Colômbia, investiu na cultura e educação através de bibliotecas públicas.  O projeto Manuelzão introduziu a visão de bacia hidrográfica superando a percepção municipalista e mobilizando a sociedade para a recuperação da qualidade das águas e renascimento dos rios.

Muito pode ser feito, tanto pelo poder publico, iniciativa privada, como pela sociedade. Aqui temos desafios, mas enormes oportunidades. O olhar ambiental e urbano, aliado à prática inclusiva e participativa, encontra um campo fértil para a melhoria da qualidade de vida, resgaste de vida em comunidade e valorização dos nossos ativos culturais e ambientais.

A cidade parece mesmo ter solução, mas depende ainda de um grande esforço de mobilização, planejamento e participação.

Sergio Myssior – Arquiteto e urbanista, especialista em gestão de projetos e MBA pela FGV, conduz há mais de 20 anos projetos significativos no segmento imobiliário, infraestrutura e ambiental em todo o Brasil. Palestrante em eventos nacionais e professor convidado. É também conselheiro do Conselho de Meio Ambiente de Belo Horizonte (COMAM), do Conselho de Arquitetura e Urbanismo em Minas Gerais (CAU/MG), do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB-MG), da Revista Ecológico e de ONG´s ambientalistas. Comentarista no programa de rádio CBN Mais BH, abordando as questões urbanas, metropolitanas e ambientais.

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